quarta-feira, 29 de março de 2017

Quando a solidão e eu viramos amigas


Algum lugar do mundo, 29 de março de 2017

Era somente mais um dia daqueles em que a solidão batia forte, rasgava por dentro. Novamente, um dia em que o meu vazio ficava proeminente, escancarado. Tão escancarado que jurava que poderiam vê-lo, até mesmo tocá-lo. Aquele buraco enorme no meio do peito. Quisera eu, talvez, que o notassem e me trouxessem o material necessário para tampá-lo.

Um dia em que, por milagre ou coincidência, não havia a correria massacrante do dia-a-dia para me distrair. Não havia compromisso, nem meta, nem nada a entregar. Pelo menos não naquele dia. Por algum motivo, o tempo caminhava mais lentamente, o ar parecia menos oxigenado e o peito mais apertado. A previsão dizia que o sol estava lá, mas só conseguia ver tudo nublado.

Um dia que me convidava a olhar pra dentro, a respirar e refletir. Uma intimação à saída do piloto automático com direito à revisão do veículo. Um dia de solidão. Costumava eu pensar, antigamente, que era falta de gente. Pensava em ter mais amigos, talvez encontrar a família, entrar numa aula de forró.  Pensava em todos que naquele momento estavam acompanhados, contemplando um sorriso ou mergulhados em um abraço. Ou mesmo naqueles que exalavam amor próprio.

Tentava lembrar-me de alguém que pudesse entender aquela crise, aliviá-la. Quem sabe se recebesse um telefonema, uma mensagem, uma carta... Porém, mais do que nunca, nestes dias, todos pareciam desaparecer. Como se pressentissem a necessidade daquele encontro e fossem instigados a não perturbá-lo. Aquele encontro inevitável que devemos ter conosco de quando em quando.

Hoje sei que a solidão vem independentemente da ausência de pessoas em volta. Sei que solidão não é saudade do outro. Não é carência tampouco. Não se cura com companhia. Já senti solidão muitas vezes estando com minha família. Em festas, churrascos, aniversários. Já senti solidão na rua, na faculdade, no cinema, na cama. Solteira ou compromissada. Vira e mexe ela vem com tudo. Não pede licença, não avisa e não adianta mandá-la embora.

A solidão, por vezes, é tão forte que chega a doer na pele, sente-se nos poros. E quanto mais fugimos desse necessário encontro com o vazio, mais ela dói. Não é por mal... É preciso recolher-se para descobrir-se. Algo nem sempre tão prazeroso no início. Na verdade, quase nunca, pois descobrir-se normalmente é sinônimo de desapegar-se de ilusões. E de ilusões somos cheios. Desapegar-se é sinônimo de deixar ir. E de resistência, somos lotados.

A solidão, invisível companheira, não faz questão de ser querida. Vem e ensina com firmeza. Só nos deixa quando cumpre seu propósito. Não tem dó. Sabe que é para nosso bem, doa o que doer. Algo que só amigos verdadeiros fazem. Daqueles inoportunos que te dizem verdades inconvenientes que relutamos em ouvir, mas que no fim provam sua importância.

A solidão parece gostar de mim. Visita-me com frequência desde criança. Costumava lutar, pedir que seguisse seu rumo. Tentei desfazer-me de sua amizade. Um dia, exausta pela sua insistência, mesmo que silenciosa, encarei-a de frente. Quando mirei em seus olhos profundamente, vi a mim mesma. Nunca me sentira tão frágil e tão forte. Ela se despediu naquele momento. Algo mudou. A necessidade de outras pessoas havia diminuído.

Resolvi, então, deixar a casa aberta para quando quisesse voltar. Passei a recebê-la com carinho. Hoje em dia, deixo até mesmo guardado alguns doces, um par de meias confortáveis e um café com canela especial que só faço quando ela aparece. Passamos, por vezes, o dia juntas, mas ela sempre vai. Ela sempre volta.   

quarta-feira, 4 de janeiro de 2017

É preciso dizer adeus ao que te faz sofrer


Algum lugar do mundo, 04 de janeiro de 2017 

Talvez você esteja numa daquelas fases em que não vê saída. Você se sente dentro de um buraco com o mundo em volta te espremendo e sufocando. Não bastasse isso, a noite cai. Começa a chover e trovejar. Morcegos aparecem. O frio dentro e fora da alma só aumenta. Todos parecem mais felizes que você.

Não deve ser a primeira vez que se sente assim. Você já esteve em outros buracos antes e conseguiu escapar. Mas não consegue se recordar como. Nem ao menos se lembra de como entrou neste, mas está fundo. E grita por alguém ou algo que te salve novamente, uma escada, uma corda... Implora. Crava todas suas unhas na parede e tenta subir com muito esforço, mas cai a cada tentativa. Quão frustrante isto é? Quantas chuvas ainda terá que suportar? Qual é o tamanho da sua solidão? A boa notícia é que você nunca foi salvo por nada nem ninguém. Você apenas deixou aquilo que o prendia nos antigos buracos morrer.

Mas, e quanto a curar-se ao invés de morrer? Sim, alguns aspectos de nós podem realmente serem curados, transmutados. Porém, há muitos outros, profundos, que precisam realmente morrer para que algo novo nasça. Deixaram de receber sangue faz tempo e gangrenaram. Não há mais recuperação. Se não forem cortados, corremos o risco de perder até mesmos nossas partes sadias. E, então, entramos nestes vales profundos da alma, em covas interiores e lutamos muito para sair, porém não podemos antes de soltarmos o lado expirado de nós.

Por mais estranho que pareça, somos apegados ao nosso sofrimento. Por mais que ele nos castigue, mesmo que doloroso, ele ainda ocupa um grande espaço na nossa vida. E se tem algo que assusta o bicho homem mais do que a dor, é o vazio.

E quando precisamos soltar algum destes estimados aspectos para caminharmos em direção ao nosso verdadeiro eu, existe um luto. Por aquela dor tão profunda e que tanto nos fez companhia. Que apesar de pesada, estava lá em nossos ombros quando ninguém mais restara. Por isso, cada vez que cair em um buraco e sentir que sua luta pela fuga está sendo em vão, reflita se, no fundo, não está lutando contra sua própria identificação com o que te dói.

Há quanto tempo você carrega este aspecto em putrefação? O quanto ele já te fez companhia? Consegue se imaginar sem ele? O quanto você já se descreveu baseado nessa dor (e fez questão de pontuar o quanto ela era grande em você)? Sobre o que conversará? De onde conseguirá atenção? Quem é você além disso tudo? O que fica, então?

Perceba o espaço vazio que a falta desse sentimento/hábito deixaria em sua vida. E se algo bom e belo pudesse ocupar o seu lugar? Você sente dó de trocá-lo após tanto tempo que passaram juntos? Você chega até mesmo a pensar que não merece viver sem sua dor. Como um relacionamento abusivo consigo mesmo. Sim, é difícil terminar esse relacionamento. Não há limites para nossa carência.

É preciso morrer por dentro constantemente. De tempos em tempos caímos em buracos. Existem muitos aspectos a serem deixados. A boa notícia é que eles aparecem apenas quando já somos capazes de lhes dizer adeus. É como trocar de pele ou perder um dente de leite. Não são tempos fáceis, eu sei. Mas vamos aprendendo a dizer “até nunca mais” cada vez mais rápido. E, assim, ficamos mais leves e flutuamos até a superfície.

Lembre-se apenas de que nunca é fora. Não importa o malabarismo que esteja fazendo, a única coisa necessária é deixar ir. Liberte-se. Deixe que sua dor morra. Arranque a erva daninha. Encare o vazio e renasça. Existe um mundo de novas possibilidades fora deste buraco. Há tantas surpresas lindas te esperando. Porém, o novo só pode vir após o vazio. E o vazio, somente após a morte do velho. Respire e deixe ir.


Imagem: https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEi1roaW0c9ahGJJIFbSHUJNQ_TbumaB6N8Z1ra0mOfwjuUl5B41oEaUvafcmjkhXLuajp8tYm775l_StcupXiMniC34LuB63pRwWINM6sPI7e4ET34H_uCScLC4j4rC2acJS0ZOD0NQqf8/s1600/bat1.jpg





terça-feira, 3 de janeiro de 2017

Sobre amores e sorvetes derretidos - quando você insiste em querer mais


Algum lugar do mundo, 03 de janeiro de 2017

O que é toda essa inconformidade com o amor que não vingou? Por que está tão difícil aceitar que não era pra ser? A ladainha já sei de cor, a mente tem certeza, mas o sentimento insiste em fisgar. Na barriga, na garganta, nos olhos que pesam e porventura lacrimejam.

O “E se...” golpeia dez vezes por dia. Não luto. Tento focar no presente. “E se...” já morreu, eu sei. Não me culpo. Já aconteceu antes e sobrevivi. O coração tem seu próprio relógio. Lá no fundo da dor existe paz, sei que vai passar. Gostaria que fosse logo. Fico triste quando vejo o coração em luto sendo que todos continuam a amar por ai. 

- Coração, fique em luto pelo que realmente vale a pena.

Mas ele me olha, como uma criança desolada pela bola do sorvete casquinha que acabou de espatifar no chão após a primeira lambida.

- Existem outros sorvetes, outros sabores. Até mesmo igual a esse que acabou de derrubar.

Não adianta. Ele lamenta incrédulo. Queria aquele sorvete ali que está no chão. Já o queria antes de tê-lo, o quis imensamente quando o provou e agora o quer ainda mais. Agora que ele está perdido e o calor que aliviaria continua castigando. E se culpa. Foi falta de cuidado? Foi a lambida descalibrada que o empurrou pro outro lado? Ou foi a mão que entortou enquanto o ouvido se distraiu com o passarinho que cantava?

Mesmo não sendo o rei da razão, até mesmo o coração sabia que não valeria a pena ir ao chão para tentar saborear o que sobrara daquele sorvete. Em primeira instância, até teve esse impulso, mas desistiu ao vê-lo sujo de terra e com os cabelos brancos do senhor da banca de jornal que caíram naquela manhã. A vida ajudou e tratou de derretê-lo rapidamente. A chuva veio e lavou o chão melado. A gordura restante, o cachorro cuidou de acabar.

Só teve uma coisa que a vida não conseguiu apagar: aquele gosto da única lambida dada. Aqueles dois ou três segundos que gelaram a língua, ativaram as papilas gustativas e refrescaram o corpo e a alma. Essa memória, o bendito coração não quer deixar ir. Abraça-a com força. E tem certeza que o resto do sorvete seria tão bom quanto àquele lapso de prazer.

Tudo bem, já disse, eu respeito. Dou o tempo que ele quiser. Fique ai na sua lamúria... Só digo uma coisa, que sorvete mais indigesto! Uma lambida e não consegue engolir mais nada há mais de mês. Imagine se fossem dois litros tomados.

- Só para que eu possa entender melhor, qual é sua esperança coração? Espera ganhar a máquina que produziu o alvo do seu deleite? Gostaria, então, de tomar sorvete até sentir o estômago doer e o cérebro congelar?

E o coração não tem a resposta. Só sente. E em prece pede ajuda pra livrar-se de tudo aquilo. Ou melhor, pede ajuda para querer soltar a saudade. Pois não quer.

Coração, o que você quer não é sorvete à vontade. Tampouco foi o gosto que o prendeu. Você quer é sentir novamente aquela sensação. Aquela primeira lambida. O gelado na língua descendo pela garganta naquele dia de sol. A glicose entrando no seu sangue e te deixando eufórico. Aquela plenitude enquanto o doce ainda não enjoou e o peso na consciência por burlar a dieta ainda não bateu. A verdade é que pouco importava naquele momento o sabor do sorvete. Aquela primeira lambida com gosto de quero mais é que te deixou assim. E agora mal concebe a ideia de experimentar outros sorvetes deixando evidente o gosto amargo na língua. Cismou que aquele caído era o melhor do mundo.

Mas, escute, em um argumento consigo convencê-lo do contrário. Talvez seu sorvete até tivesse potencial de ganhar um prêmio regional ou outro não fora por um óbvio detalhe. Não era firme. Derreteu com o calor do ambiente e do seu corpo e espatifou ao chão. E, veja, não se trata de algo irrelevante. Consistência é um requisito imprescindível a um sorvete de boa qualidade!

Coração... Amigo... Chore o quanto quiser pelo sorvete derretido. É fácil apegar-se às primeiras lambidas. Assim como ao primeiro gole de água quando estamos com sede. Mas não se esqueça de ir limpando o paladar. A gente nunca sabe os sabores inéditos que a vida fabrica. E acima de tudo, saiba que existe um sabor cujo gosto ainda não provou, mas que jamais será superado. Sabor este que não enjoa, não derrete nem faz mal e que guarda ai dentro de ti.


“Você tem que aprender a levantar-se da mesa quando o amor não está mais sendo servido.”
Nina Simone

Imagem: http://www.arsenalecreativo.com/ice-cream-love-and-storytelling/

domingo, 11 de dezembro de 2016

O amor é para os corajosos - é preciso estar pronto pra amar


Algum lugar do mundo, 19 de novembro de 2016
Meu bem,

Pule fora de amores mal dados, afetos de má vontade, conflito e confusão. Caia fora. Encare de vez essa carência e solidão.

Sei que tem muito amor para dar. Que seu coração sofre por não encontrar alguém que mereça recebê-lo e, mais ainda, retribui-lo. Mas, corra, quantas vezes forem necessárias, dos que te fizerem duvidar se ainda vale a pena amar. 

Rejeite, enjeite, rechace tudo que for forçado, empurrado, engolido. Normalmente, regado à ansiedade e descaso. Não tema dizer adeus, quantas vezes forem necessárias. Mesmo que seu medo de ficar só seja insuportável. Não existe solidão maior do que estar sozinho acompanhado. Do que não se sentir retribuído. Mendigar afeto e não ser amado.

As situações talvez estejam se repetindo para que aprenda alguma lição. Amor verdadeiro requer preparo e maturidade. O que falta ser entendido? A cada adeus, o que fica, então? Melhor ainda, o que você deixa que levem? E sinto muito. Não é roubado. É dado de bom grado. Conscientemente ou não. A quem você dá permissão de tirar seu rumo, seu sono, seu sossego sem que seja para amar?

Talvez a lição mais dura seja aquela que nos ensina que o amor próprio precisa vir primeiro. De que não devemos buscar nossa metade: devemos ser inteiros! Inteiros o suficiente para não deixarmos que qualquer um entre e bagunce nossa casa. Deixe que os indecisos se resolvam, que os machucados se curem, que os sem esperança decidam arriscar. Amor é para os corajosos e antes que ele chegue, é preciso estar pronto pra amar. 

Moça, moço, agradeça a tentativa, diga não, dê adeus. Chore talvez, por um dia ou dois, mas com a certeza que não era seu. Se não for seu caminho, não adianta malabarismo, reza, superstição. Não vai pra frente. O amor chega pra quem está preparado, aparece de repente, naquele momento em que nos sentimos completos com o que somos. Flui naturalmente.

Pare agora de dar murro em ponta de faca. Acredite que o amor existe da boca pra dentro, pra dentro da alma. E aja de acordo com isso. Não existe nada de errado em ser intenso, ir com tudo, dar seu melhor. Não jogue! Seja você mesmo. Esse nunca foi o problema, pode acreditar. Aquele que vier pra somar gostará do lado bom e do pior. Portanto, ao primeiro sinal de falta de reciprocidade, diga adeus, mude a direção: escolha a si mesmo! E faça com que não exista amor maior. 

Estamos combinados?

A corajosa geração que tem medo de amar


Algum lugar do mundo, 11 de dezembro de 2016

Você sabe, não é tarefa fácil amar alguém. É preciso ter uma energia, uma generosidade, uma cegueira. Há até um momento, bem no início, em que é preciso saltar por cima de um precipício: se refletirmos, não o fazemos.
Jean-Paul Sartre

Cuidado para não guardar esse potencial para amar por toda uma vida e privar-se dos seus sonhos mais clichês pensando ter agido por coragem, quando na verdade deixou que seus medos o dominassem. Neste momento, não diga que está sozinho por ter sido nobre quando decidiu não magoar, e quem sabe até mesmo não destruir, pessoas especiais que encontrou pelo caminho.

E matou lindos amores antes de terem nascido. Por um tempo a mais para viver livremente. Por um tempo extra pra se autodescobrir, criar coragem, ter certeza. Esperando a hora exata. Só não sabia que quanto mais se descobrisse, mais se daria conta de seus vazios, mais medo teria e mais incertezas te assombrariam a cada decisão. Só não entendia que amar – de verdade – não implica em parar todo esse processo. Onde aprendeu que amor é sinônimo de estar algemado, trancado, impedido de mudança e crescimento?

E quem disse que tem obrigação de só fazer escolhas certas? De que não pode simplesmente encarar uma decisão errada e mudar de direção conscientemente? Agora, encontrar um caminho cheio daquilo que gostaria e abandoná-lo não é prudência – é covardia.

Não me entenda mal. Respeito seu momento e suas angústias. Elas não são sem sentido. Existe sim nobreza em assumir suas fraquezas e não querer que elas destruam a quem você viu um brilho. Deve sentir-se orgulhoso em não estar mais naquele ponto em que se arrisca e, se não der certo, dane-se o outro. Mas quem é você para saber o que a cada um é fatal? Deixe disso. Tem medo é de perder-se novamente e de não saber quem você é no meio de dois. Tem medo de não conseguir enxergar onde estará a vírgula, as reticências e o ponto final.

Preciso te contar uma coisa. Sabe aquele seu relacionamento fodido? Que te deixou com tanto receio de amar novamente? Doeu demais, não é? Como é triste ver transformar-se em estranheza algo que fora um dia tão lindo. Quanto sofrimento. Quanto dano foi causado em vocês. Você não quer isso novamente. É prudente, entendo. Você sofre por algo que quebrou. Não tinha mais jeito. O apego te deixou naquela situação até que os sentimentos apodrecessem. Não se sinta culpado, talvez não haja um só ser que não tenha passado por um desses.

Acontece que o problema nunca foi amar e ser amado. O problema nunca foi estar em um relacionamento. E agora acredita que este é o perigo. O perigo é a falta de sinceridade e respeito. É continuar pisando em terra onde o amor já morreu faz tempo. E ao tentar evitar sofrimento igual fugindo de planícies férteis, talvez encontre um novo tipo de dor mais a frente: a dúvida do que poderia ter sido, mas não foi por receio do mesmo (ou do pior). E tenho dito, medo é algo que cresce rapidamente mesmo em ambientes inóspitos. Imagine nesse seu coração?

Se me ouviu até aqui, deixe-me prolongar mais um pouco... Não existe tempo certo além do agora. Cuidado com as decisões que toma e que são baseadas em pensamentos sobre o futuro, pois quem fala por ele é o medo ou a ansiedade, os quais não são lá muito conhecidos pela criação de roteiros bonitos. O amor só fala no presente, em breves momentos. Na vontade de ter mais um abraço daqueles que aquecem a alma. De sentir aquela sintonia em uma conversa que vai muito além de papos Leblon. Ok, talvez seja bom somente por um final de semana, um mês, um ano... Vai saber? Mas, por que privar-se desse presente da vida ao preferir o pretérito imperfeito? Meu bem, viver não pede que sejamos perfeitos. Às vezes vale a pena pagar pra ver.

Talvez pense que estou a tentar convencê-lo. Negativo. É que vi em você algo especial, um potencial para o profundo e fiz questão de deixar a reflexão. Pode não ser pra agora, mas que seja feita a cada vez que a vida te trouxer uma boa razão. Se minhas palavras pareceram praga, não é a intenção tão pouco. Nada do que falo é livre de erros. Aqui não existe verdade absoluta, somente o que sinto – o que vai muito além do que vejo. Além disso, não há problema algum em querer estar sozinho. Até mesmo em passar a vida em breves paixões. Só tenha certeza de que estará agindo pelos motivos certos e fique atento, pois o medo, apesar de pessimista, é esperto e se disfarça de nobre intenção.   

domingo, 4 de setembro de 2016

Luto pelo amor que acabou antes de começar



Algum lugar do mundo, 04 de setembro de 2016

Sinto sua falta e está doendo.

Sinto falta do que houve, do que poderia ter sido, sinto mais falta ainda do que não tivemos.

Sinto falta dos cafés que tomamos, das horas que passamos conversando, de como tudo fluía tão bem. Era fácil sorrir ao seu lado.

Sinto falta do seu carinho, do seu abraço e de como me esquecia de tudo quando estava nos seus braços. Sinto mais falta ainda daquele último que nunca me foi dado.

Sinto falta do seu cheiro e da sua segurança, quase arrogante, de quem tinha um medo profundo de ser ferido. Do seu sorriso no canto da boca enquanto falava ao seu ouvido.

Sinto falta de quando me ouvia tocar violão encantado. E a tudo gravava, como se o concerto fosse digno de reconhecimento. Como seria bonita a música que nunca te fiz e cantaria no nosso aniversário e, depois, quem sabe, no nosso casamento.

Sinto falta daquele dia quando me disse que já não saberia mais como viver sem mim. E, sua mão, seu olhar e seu coração transbordavam gratidão e amor. Quando me disse que de seu passado nada sobrara e só tinha olhos para o presente. Entretanto, nunca curou-se daquela dor.  

Sinto falta do café da manhã que me levou na cama com um bilhete carinhoso e uma flor. E da massagem que ganhei nas costas, despretensiosamente, naquele sábado qualquer. Com cheiro de chuva, bolo e sua pele. Não houve um só dia assim sequer.

Sinto falta das noites em que me ouvia chorando e, pacientemente, esperava que toda a tempestade passasse enquanto alisava meu cabelo dizendo que tudo tinha jeito. E, então, dormíamos abraçados e trocava o sufoco das lágrimas pelo seu peito. Restou-me apenas o travesseiro. 

Sinto falta dos nossos planos de viagem, nossa família, nossos filhos e cachorros. Poderia discorrer em infinitos parágrafos como era feliz e linda a história que nunca tivemos. Poderia falar dos desafios que nunca superamos juntos e dos sonhos que nunca vivemos. 

Aqui jaz um amor que acabou antes de começar. Aqui jaz a planta que morreu antes de nascer. Aqui enterro somente expectativas. Que descansem em paz. Mas que os sonhos sejam eternos, porém. Pois sonhos são sementes aguardando um terreno fértil que as queira bem. 

sábado, 6 de agosto de 2016

Nada nem ninguém vai tampar esse vazio - terá que mergulhar nessa escuridão


Algum lugar do mundo, 04 de agosto de 2016

Esse vazio que sente, nada nem ninguém poderá preencher. Nem cigarro, parente ou mesmo os mais belos presentes vão te completar. Nem novela, balada, bebida nem mesmo a vida que sonha em ter. Nem amigos, estilo, nem os títulos mais pomposos irão te bastar. Nem sexo, reconhecimento, o calor do momento ou carros bonitos o farão passar. Viagens pra Disney e fotos com milhares de curtidas não te acalmarão. Nem dinheiro, uns quilos a menos ou todas as comidas que pra dentro enfia.
  
Talvez, até seja distraído por alguns momentos, assim como funciona um remédio para dor. No momento em que o efeito vai embora, o sintoma se agrava, por ter forçado a parte machucada enquanto a ignorava. E por evitarmos nossas feridas, elas vão se acumulando, criando uma densidade tão grande dentro de nós, que de tanto e há tanto clamarem por atenção, acabam por tornarem-se buracos negros carregados de dor e incompreensão. 

E sugam a tudo e a todos e nem mesmo a luz resiste à tamanha gravidade. Tornam-se vórtices negros e acabam por sugarem a nós mesmos. E procuramos fora, desesperadamente, algo que possa nos preencher. Mas tudo é sugado novamente para esse depósito escuro para onde não queremos ir, onde jamais gostaríamos de mexer. E esse buraco, sentido como falta de algo ou solidão, nada mais é do que a falta de si mesmo

Porém, como é grande o medo de nos afogarmos nessa sujeira, de cairmos lá dentro com tudo. Tememos e, no fundo, sabemos que esse buraco é muito fundo. E se dele não sair? E se não houver nada melhor do que já tenho a ser encontrado? Se me perder ainda mais ao tentar me conhecer? 

Na verdade, o que tememos não é a perda de nós mesmos, mas das ilusões que nos mantem “vivos”. Das máscaras que nos agarramos para evitar a dor, para vivermos em um mundo que nem sempre é fácil e cheio de amor. Temos medo de perder essas escoras, essa gambiarra emocional e mental que fazemos todos os dias para suportar o fato de não sermos íntegros o suficiente para viver nossas verdades. Verdades que muitas vezes desconhecemos.

Ironicamente, ser verdadeiro é o único caminho para felicidade. E para isso, terá realmente que queimar todas as máscaras que já vestiu. Deverá derrubar todos os muros construídos com tijolos de medo. Precisará cortar essa fita crepe e os barbantes que usa para enquadrar-se nas expectativas dos outros. E terá que curar cada ferida que criou ao negar-se. Ao diminuir-se. Esconder-se. Não tem jeito. Terá que enfrentar seus monstros.

Felizmente, a cada ferida curada, seu salto, inicialmente, em plena escuridão, tornar-se-á cada vez mais claro. Iluminado pela luz mais forte que já encontrou, tão forte, que o sustentará fazendo com que sua queda vire voo. E quando todo o entulho for removido, terá um novo terreno onde poderá fincar bases fortes. Nada de galpões remendados. Agora, poderá construir castelos com belos pátios floridos. Quartos acolhedores e salas aconchegantes com quadros coloridos.

Nessa nova morada, só entrarão aqueles que realmente dela gostarem. Irão de livre e espontânea vontade. Devo alertá-lo, serão poucos perto dos que frequentavam seus velhos galpões. Porém, agora, sua casa não mais precisará estar tão cheia de coisas e pessoas. Estará cheia de sua própria luz e nela sentirá prazer em viver. A falta que antes sentia agora virou alegria - de SER.